Um Conto no Oeste

Do cano de seu revólver
Ainda foge a fumaça
Ainda reflete no ouro
O céu e parte da praça
E o silêncio do momento
Só se quebra quando o vento
Diz: nem todo dia é da caça

E a fumaça do revólver
Como o sangue num punhal
Denuncia aquele tiro
Para bem ou para mal
Na fumaça o sangue arde
E se eleva ao fim da tarde
E avermelha o céu total

Como fosse por acaso
Jaz um corpo na calçada
Olhos negros como a noite
Como se não fosse nada
Vermelhos o chão e o céu
Sob a sombra do chapéu
Vêem a cena alcançada

Mas a noite vem chegando
No cavalo mais ligeiro
E aquelas botas de couro
Do par de olhos forasteiro
Se vão firmes ao cavalo
Sobem e partem no embalo
Pois a noite é seu terreiro

Uma Lua e as estrelas
Tímidas, da escuridão
Vão surgindo pouco a pouco
Vendo a estrela do chão
Está morto o xerife
Era um herói? Um patife?
Já foi vivo, hoje já não

Naquele cavalo branco
Galopando a noite insana
Sorri sob seu chapéu
Sob a Lua soberana
Se afastando da cidade
Sob vento e liberdade
Sorri leve Tatiana

Do alto de um penhasco
Alto como um arranhacéu
Procurando seus iguais
A fumaça busca o céu
E às nuvens se mistura
Para enfeitar a pintura
Do lugar, que é um painel

Dali de cima, Tatiana
Que já trocou sua roupa
Sentada olha pro mundo
Tomando um prato de sopa
Há tanto vivendo assim
Mas o Destino, por fim
Sua vida sempre poupa

No alto desse penhasco
Só uma árvore há
Nela um cavalo amarrado
Pra não fugir do lugar
É só um cuidado dela
Numa paisagem tão bela
Quem ia querer escapar?

E ela sorri para o mundo
Sorri pra Lua, pra Vida
Apaga a fogueira feita
Se deita ao chão estendida
Muitos dela iam ter pena
Mas, grata, ela ainda acena
À Natureza servida

Como cantigas de banjo
Raios dourados do Sol
Lhe vêm dourando o deserto
Dizendo: não estás só
E ela sorri lá por onde
Com olhos negros, responde,
Herdados de sua avó

Ainda era muito cedo
E a fogueira, no canto
Apagada, abandonada
Pra trás ela foi deixando
Some o dourado do dia
E o ouro permanecia
Em seu revólver brilhando

Corria como selvagem
O seu cavalo sem nome
Pelo deserto parece
Ser de vento a sua fome
De alma tão livre e ufana
Que se não fosse Tatiana
Não havia quem lhe dome

Ela nunca leva mapas
Nada lhe pode guiar
Sem Sol, estrelas ou setas
Livre como águia no ar
Atravessando o deserto
Sem ter um destino certo
Indo pra qualquer lugar

Por baixo do seu chapéu
Tão poucos anos de idade
Entre menina e mulher
Pára e a alegria invade
Sorri e some de vista
Tão logo ao longe ela avista
Parte pra nova cidade

A cidade é bem pequena
Como tantas por aqui
Com gente desconfiada
Com prédios por construir
E ela, uma forasteira
Vê a cidade inteira
Estranhando ela surgir

Enquanto ela entrava
Por um lado da cidade
E o povo fechava a cara
Com temor e ansiedade
Por outro, vinha ligeiro
Um bando de forasteiros
Perigosos de verdade

Cinco filhos do deserto
A poeira os pariu
Rudes, fortes e perversos
Armados, assim se viu
Que assim como Tatiana
Vagam sem rumo e sem grana
Com a vida por um fio

Ao adentrar a cidade
Pra conhecer o lugar
Como era seu costume
Tatiana vai ao bar
Como sempre nessa vida
Não é tão bem recebida
Mas só finge não notar

Mas o sorriso sincero
Que ilumina esse momento
Deixa a dúvida no ar
Será que é só fingimento?
A sua simplicidade
Parece ingenuidade
Da filha do Sol com o Vento

Lá fora o bando chegado
Para evitar problema
Está na delegacia
Rendendo todo o sistema
Pois assim, ao ir roubar
Ninguém vai atrapalhar
E a vitória será plena

Logo partem para o banco
Cinco armados forasteiros
Anunciando o assalto
Pedindo todo o dinheiro
Os funcionários com medo
Obedecem, sem segredo
Pra tudo acabar ligeiro

No bar está Tatiana
O barman e mais ninguém
Entediada com isso
Resolve sair também
O povo se escafedeu!
Ela paga o que bebeu
Com o pouco que ela tem

No caminho de saída
Daquela cidade triste
A sorte muda de rumo
E uma confusão assiste
Vêm os cinco forasteiros
Trazendo todo o dinheiro
Do assalto que ora viste

Debaixo de seu chapéu
Sorri Tatiana de novo
Pára no meio da estrada
Quando vem aquele povo
O cavalo ela pára
E os cinco ela encara
Como quem fita um estorvo

- Saia já da minha frente
Cavaleiro desgraçado
Outra opção: eu te mato
Se isso for do seu agrado
Se quiser uma disputa
Você não terá ajuda
Já prendi o delegado

O vento corta o silêncio
Com sua harpa aparente
O sorriso de Tatiana
Diz que ela não sai da frente
Encara sem medo ou pranto
E para causar espanto
Responde ela prontamente

- Ninguém mandará em mim
Eu só vim beber um vinho
Vocês que voltem por lá
Eu estou no meu caminho
E estou no meu direito
Vocês é que dêem jeito
De sumirem rapidinho

Dois do cinco prontamente
Engolem a gargalhada
Ao avistarem o líder
Com a cara enfezada
Salta do cavalo ao chão
Com o revólver na mão
E a arma carregada

- Se você foi beber vinho
Bebeu mais do que devia
Somos cinco, você uma
E com tanta valentia!
Mas temos tempo, eu sinto
Vamos ver se encara os cinco
Na cama da hospedaria

Ela levanta o chapéu
Mostrando seus olhos pretos
Trazendo o mesmo sorriso
Frente à falta de respeito
Sem temer, ela somente
Desce e dá um passo à frente
E responde desse jeito

- Não vou mais perder meu tempo
Com gente da sua laia
Eu vou contar até três
Pra que todo o grupo saia
Da minha frente num giro
Ou senão eu mesma tiro
Sei que são fogo de palha

Terminando a discussão
Os cinco se aborreceram
Botaram armas nas mãos
De seus cavalos desceram
Apertaram o gatilho
Mas suas armas sem brilho
Nunca mais obedeceram

Os cinco com ela na mira
No gatilho, dedo e urgência
Mas os tiros que ouviram
Na cidade em decadência
Vieram do outro lado
Ela fez, como um tornado
Cinco tiros em sequência

Logo após o tal barulho
Perdem a força na mão
Sem disparar um só tiro
Um a um, despenca ao chão
Tatiana vê seu feito
Uma bala em cada peito
Cada uma, um coração

Ela volta ao seu cavalo
Sem fazer qualquer esforço
Guarda a arma e olha o céu
Alongando o pescoço
Passa pelos forasteiros
Com seus sacos de dinheiro
Bota umas notas no bolso

Tatiana vai embora
Da cidade onde lutara
Com um sorriso no rosto
E a lembrança das falas
Sobrevivera por pouco
Em seu revólver de ouro
Só cabiam cinco balas

O Sol ficando mais forte
Ela cavalga igual
Recoloca cinco balar
No tambor e limpa e tal
O revólver ajustando
E sorri cantarolando
Qualquer cantiga rural

Segue livre no deserto
Como quem paga promessa
Seguindo o próprio caminho
Sem nada que a impeça
Sozinha no seu cavalo
Viaja pra todo lado
Mas que viagem é essa?

Sorri Tatiana assim
Sob esse céu sem medida
Como quem está nem aí
Brincando co'a própria vida
Nessas terras não há mais forte
E ela sempre vence a Morte
Pois da Sorte é protegida

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