Cordel Encantado

Cordel Encantado acabou. Foi muito bom o fato de terem dado valor à Cultura nordestina (mesmo que na forma de homenagem). Também foi muito bom terem feito mais uma novela que foge daquele cenário atual urbano Rio-São-Paulo. Agora que acabou, vamos falar um pouco do que foi essa novela.

Para quem não conhece, o cordel é bastante forte e tradicional no Nordeste brasileiro. Já existia em Portugal e aqui ganhou força. É bem verdade que antes mesmo do cordel português, poesias épicas enormes sempre tiveram lugar nas mais variadas líguas e culturas.

Cordel é uma poesia enorme, mas com características próprias. O nome vem do hábito de ser vendido em feiras, em livretos (um livreto por história/poesia), pendurados em barbantes, chamados na época de cordéis. Hoje o cordel continua vivo.

São temáticas comuns em cordel os casos regionais e as pelejas. Usam-se elementos folclóricos por vezes, como lobisomem e mula sem cabeça; por vezes envolve-se personagens memoráveis como Lampião e Seu Lunga. A peleja é uma disputa, fruto de um duelo entre dois personagens. A peleja pode ser um registro de uma disputa de repentistas ou pode retratar um confronto hipotético ou fictício.

Quanto à capa, há os mais diversos tipos de ilustrações: fotos de lugares, fotos de esculturas (como é o caso dos cordéis do pernambucano Mestre Galdino) e desenhos em papel (ou em computador, como os meus). Apesar de todas essas possibilidades, o mais comum e o realmente tradicional é o uso de xilogravuras. O procedimento é: esculpe-se em madeira uma espécie de carimbo para a imagem do cordel, daí imprime-se a imagem.

Pessoalmente, tenho alguns cordéis meus por aqui. Em especial, recomendo o Cordel da Pirataria, a Peleja de Pelé contra Roberto Carlos, o Castelo do Rei Falcão e o Cordel Digital, como exemplo desta literatura. Fugindo um pouco das regras de cordéis, recomendo os cordéis Castelo Gótico, Você tem os fontes também e Asas Negras.

Agora falando da novela especificamente, vamos começar pelo seu ponto mais forte: a abertura.

Primeiro, a música do Gilberto Gil é excelente. Passa um ar épico por si só e resume o roteiro, em parte. Coisa de gênio que ainda não deixou de pensar e de inventar coisas novas.

Já a animação é outra pérola. Inspirada na xilogravura, mas com conceito de camadas, com sombra e com movimentação dos elementos, me chamou muito atenção e me fez imaginar como seria bacana um jogo eletrônico inspirado em xilogravuras, nesse jeitão. Alguém se habilita a fazer um? (ou já conheceu algum assim?)

Quanto à novela em si, ela foi feliz ao trazer o foco para o mundo do Cordel. A ideia de juntar rei e cangaceiro é por si um elemento rico se bem explorado. A princesa sumida... O figurino foi bem trabalhado, atores muito bons. O prefeito de Brogodó, por exemplo.

Era uma novela que tinha tudo para ser fenomenal: um bom conceito, boa equipe de produção, bons elementos chave... Algumas coisas, porém, não funcionaram tão bem quanto poderiam.

O conflito dos cangaceiros com o vilão da história, o coronel Timóteo, foi muito infeliz. A infantilidade de imaginar que homens forjados na batalha do dia a dia dentro da mata teriam pena de matar o sujeito nas infinitas oportunidades que apareceram, ou de deixá-lo pegar armas no chão quando estava rendido e cercado, e atitudes similares, fizeram os cangaceiros parecerem mais com senhoras beatas do que com cangaceiros de fato. Pode-se dar um desconto à falta de violência deles devido ao horário em que a novela passou, mas não à falta de sagacidade.

Apesar de o cordel fazer uso muitas vezes de elementos externos, como referência, homenagem ou mesmo releitura de clássicos, a novela abusou do recurso. O Homem da Máscara de Ferro, o Fantasma da Ópera, o Conde de Montecristo, dentre outros. É bacana esse tipo de homenagem. Quando você escreve uma história de alto nível, criativa, o uso de elementos externos enriquece a sua história e é digno de elogios. Quando você escreve uma história que se desenrola de um jeito meio forçado, repetitivo e previsível, o abuso das referências pode levar a crer que as homenagens não são bem homenagens, mas tábuas de salvação na falta de criatividade.

Não há muito o que falar sobre o último episódio. É a forçada de barra extrema de sempre. Todos os personagens se acertam, se casam e tudo se resolve. Até passa o que aconteceu vários anos depois pra ficar provado que todos se acertaram muito bem acertado. Parece até que o quão bem termina a novela é usado como prova de competência do autor. Detesto mesmo isso. Não há nada mais artificial.

Por fim, volto ao que disse no início: parabéns à Globo pela abertura da novela, pela ideia de fazer uma novela inspirada em cultura popular nordestina e pela fuga da mesmice. De qualquer forma, no balanço geral foi muito melhor que a média das novelas que ela faz. Agora que acabou, posso voltar à minha vida sem novelas.

-- Cárlisson Galdino

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