Punição

Flap, flap, flap... Como um metrônomo asas batem compassadas há longos minutos. No céu aquela criatura se desloca entre duas cidades distantes. Cidades estranhas, de uma terra estranha. O ar pesado, o céu está escuro em tons de cinza. As pessoas se matam lá embaixo por trocados, na esperança de poderem comprar aquilo de que nunca precisaram.

São cidades em ruína. A fumaça corrompe a atmosfera do planeta enquanto as invenções já corromperam o coração dos homens.

Em meio a esse caos e alheio a tudo isso, aquela criatura voa. Voa e já consegue ver a cidade, o que é espantoso se há tanto cinza no ar. Ele voa e sorri, levando nas mãos aquele globo, que traz de tão longe.

Suas roupas vermelha e branca em farrapos. Suas asas, que deixam suas costas e batem em um ritmo constante, parecem cansadas.

Logo vem a guarda da cidade. São serpentes que voam, têm chifres e asas. Elas não esperam: atacam.

Os olhos do viajante se concentram na presença da ameaça. São três serpentes. Com habilidade, ele movimenta as asas arremessando o corpo subitamente para cima. As serpentes se jogam no vazio que ele deixou, mas desviam e o seguem no seu vácuo.

Complementando seu movimento, ele mergulha surpreendendo os pequenos monstros com garras que cortam como navalhas.

O primeiro movimento lhe deu apoio para esse mergulho e, ao mesmo tempo, obrigou as serpentes a reduzirem sua velocidade. Agora, pedaços de serpentes se contorcem nos céus, em queda livre. Caminho livre.

E ele respira fundo, mas vai em frente. Ali está a cidade, sem saber de sua chegada.

Dos céus ele pode ouvir o som inconfundível das festas e cultos impuros. Franze a testa e segue em frente, com ainda mais determinação do que antes.

A praça principal da cidade está em festa. Comemoram alguma banalidade qualquer. O que seria desta vez? Aniversário de alguém ou de algum dia especial? Uma vitória na Arena? Política? Que importa? A criatura vem suavemente.

Do chão alguns ainda param para ver melhor. Aquele ser alado deslizando nos céus até a estátua do cálice de ouro, no topo da coluna, no meio da praça.

Quem vê demonstra a mais honesta alegria. Em suas mentes a incerteza do que veem. Seria uma criatura alada ou seria fruto de tudo o que vinham consumindo nos últimos momentos? Últimos momentos...

O globo é deixado no cálice e a criatura se afasta, rapidamente, seguindo o caminho contrário ao que a trouxe.

Fora da cidade, ela reduz a velocidade e gira no ar, virando-se de volta. E observa.

Flap, flap, flap... Observa.

Uma chama esfumaçada começa a aparecer. Ela cresce em espiral a partir da praça. Ela se expande em espiral, como uma bola de fogo amarrada ao centro, enrolada, girando presa pela corda e aumentando o raio por estar se desenrolando. Uma bola de fogo que deixa fogo por onde passa. Aquele disco de fogo aumenta até consumir toda a cidade.

E aquela criatura apenas observa.

Flap, flap, flap. E sorri. E acha aquilo lindo.

Então, dá as costas e volta para casa, bem mais lenta do que quando veio trazendo o globo. Agora volta levando a sensação de dever cumprido.

-- Cárlisson Galdino

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